O café figurou entre os 15 produtos do agronegócio brasileiro que foram mais exportados aos países árabes em 2022. Nesse grupo a commodity foi, ainda, a que teve maior alta no preço pago pelo bloco. O grão foi negociado na Liga Árabe a US$ 3.962,57 por tonelada, alta de 88,10% sobre o ano anterior. Os dados foram compilados pelo Departamento de Inteligência de Mercado da Câmara de Comércio Árabe Brasileira e divulgados neste mês.
Se o preço pago pelo produto foi maior, por outro lado houve queda tanto em volume quanto na receita do que foi vendido ao bloco árabe. O Conselho dos Exportadores de Café do Brasil (Cecafé) divulgou que foram exportadas 845.860 sacas de 60 quilos à região, uma queda de 48,1%. E a receita gerada foi de US$ 206,9 milhões, também com redução de 4%.
Em entrevista à ANBA, o presidente do Cecafé, Márcio Ferreira, falou sobre o que pode explicar essa contradição. No geral das exportações, o executivo destaca que houve problemas no embarque do produto em 2022. “Questões logísticas levaram à queda do volume da exportação como um todo, apesar do ganho substancial no valor”, disse ele.
Somado a esses dois fatores, que impactaram a produção da espécie e refletiram nos preços, Ferreira lembra que o mercado vinha de um período de especulação de antemão. “Já tinha a questão da pandemia, quando as pessoas não sabiam até quando iria”, disse ele, lembrando que muitos consumidores correram para garantir seu abastecimento. E pagaram o preço por isso.
Bebida rio
Mas o menor volume vendido aos árabes tem mais motivos. “Nos países árabes, há uma característica do consumo do café rio. É o mesmo sabor que a comunidade do Mediterrâneo está acostumada a tomar. E o único país que produz café arábica com essa característica de bebida é o Brasil”, detalhou Ferreira. O café tipo rio é uma classificação dada nos mercados internos para grãos com menor qualidade e, consequentemente, menor preço.
E aqui entra novamente o impacto das intempéries climáticas. “As regiões que foram afetadas produzem café rio. Por ter um custo mais barato do que de outros cafés, ele também é demandado no consumo interno. A falta de arábica fez com que a cotação na Bolsa de Nova York, nos últimos dois anos, mais do que dobrasse. Saiu de US$ 100 e foi a US$ 240 [por saca de 60 quilos]”, disse ele, referindo-se à bolsa que opera os preços externos da espécie arábica.
A alta nas cotações internacionais fez os preços em dólar subirem inclusivo no arábica bebida rio, preferência do consumo dos países árabes. Por ser muito utilizado misturado a outros grãos para formar blends, o café rio também tem demanda no mercado interno. Lá fora, para driblar o aumento no preço do café tipo rio, o bloco árabe trocou de ingrediente no blend e aumentou a importação de café da espécie canéfora, vindo de países como o Vietnã.
Negociadores natos
Nesse tabuleiro há, ainda, outra importante estratégia em jogo. A negociação. Embora o mercado do café seja regulado por bolsas de valores internacionais, os compradores podem optar por diferentes formas de contrato. Por escolhas como essa, os países árabes têm um histórico de conseguirem bons preços, muitas vezes abaixo de outros grandes compradores do produto brasileiro.
Se anteriormente o bloco árabe conseguiu preços abaixo dos demais, isso pode explicar porque em 2022 o aumento foi tão significativo para eles. Mas como isso acontece? “No café, a comunidade árabe tem uma característica de ir muito pelo preço fixo. Enquanto isso, outros consumidores trabalham muito em cotação em diferencial contra a bolsa. Como o árabe não faz isso, toda vez que a bolsa subiu bastante, o árabe comprou melhor. E como eu te falei, a bolsa [nos últimos anos] mais do que dobrou. O árabe já comprou fixo e com antecedência. E eles são bons na negociação, já faz parte da cultura”, concluiu Ferreira.
Fonte: ANBA
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