Primeiro foi o soldado Antonio Elias Matos Silva, 31 anos, da Rondesp Sul, baleado no sábado (11), quando fazia ronda em Porto Seguro, no sul do estado. Em menos de 48 horas, o tenente Mateus Grec de Carvalho Marinho, 35, da Rondesp Atlântico, foi atingido durante confronto com traficantes no domingo (12), no bairro de Cosme de Farias, em Salvador. Para além da trágica coincidência de terem sido mortos durante o trabalho, eles agora fazem parte de uma lamentável estatística: o número de PMs mortos neste ano aumentou 38% em relação ao total do ano passado.
De acordo com a Polícia Militar, até agora são 18 policias mortos, sendo oito em serviço, cinco durante a folga e cinco já estavam na reserva. Já em 2020, 13 PMs morreram – um estava trabalhando e os demais no período de folga.
Em relação aos números, a Secretaria de Segurança Pública (SSP) disse que lamenta profundamente as mortes violentas de policiais e determina, nesses casos, total “auxílio às famílias, além de prioridade na investigação e identificação dos autores”.
“Ressalta ainda que, nos últimos dois casos, os militares desempenhavam a principal função que é combater o tráfico de drogas e acabaram feridos fatalmente. A pasta destaca também que é urgente uma reformulação no Código Penal, para diminuir a sensação de impunidade e a ousadia dos criminosos, que acreditam na rápida soltura e possibilita o retorno imediato às ações ilícitas”, diz a nota.
Na noite dessa segunda-feira (13), mais um PM baiano foi morto. Desta vez, por policiais militares de Petrolina (PE), que o confundiram com um ladrão. Joanilson da Silva Amorim estava de folga, quando foi chamado por vizinhos, por volta das 18h, para ajudar na captura de suspeitos que fugiam após invadirem imóveis do bairro.
Após a chegada de policiais civis de Pernambuco, o soldado Joanilson foi confundido com um dos criminosos e baleado com três tiros, que atingiram cabeça, braço e perna. O policial não resistiu aos ferimentos e morreu por volta das 20h dessa segunda.
Tropa
Alguns PMs falaram sobre o risco da profissão. Todos eles aceitaram falar na condição de anonimato, assim evitam represália na corporação. Um deles dise que o temor é não retornar à família. “É saber que está em uma lista aleatória em que você pode ser o próximo a qualquer momento, sem ter como preparar sua família e amigos para essa hora, pois não sabe quando será”, disse o PM.
Um outro policial detalhou o risco do ofício. “Não podemos andar de ônibus para não ser assassinado, não podemos morar na favela para não ser assassinado, não podemos frequentar os lugares que as pessoas comuns frequentam, para não correr o risco de ser assassinado. Não temos paz, nem em dias de folga, pois são os dias que estamos mais vulneráveis e tememos ser identificado e pagar por isso. Enquanto as leis são afrouxadas para os marginais, nós somos rechaçados, presos, perdemos nossos empregos e nossas vidas e nada é feito para consertar isso”, declarou.
Um outro policial disse que os riscos já são conhecidos, como o fato de entrar numa viatura e não conseguir voltar mais para casa. No entanto, ele relatou outro fator tão preocupante quanto, que ele denomina de “inimigo interno” “É estar o tempo todo trabalhando sob ameaças e assédios dos nossos superiores hierárquicos. Nos cobram produtividade sem nos dar os subsídios mínimos para alcançá-las, nos culpam pelos altos índices de criminalidade, como se culpa nossa fosse, nos colocam para trabalhar em locais de grande risco, com péssimos materiais de trabalho, armamento defasado, viaturas sucateadas, e muitas vezes com apenas um colega ao lado, em alguns casos, como no Pelourinho, trabalhamos até sozinhos”, desabafou.
Algumas entidades de classe comentaram os dados. “Lamentável. Não é cabível que esses casos sejam normalizados. Esperamos que a Polícia Militar (PM) e a Secretaria de Segurança Pública (SSP) deem segurança, investindo em condições de trabalho e tecnologia para que a tropa possa fazer frente à criminalidade e também que possam ingressar com medidas no legislativo para inibir as ações dos delinquentes”, declarou o presidente da Associação dos Oficiais Militares Estaduais da Bahia (Força Invicta).
A Associação dos Policiais e Bombeiros Militares e Seus Familiares (Aspra) na Bahia criticou os números. “O dado reflete um cenário de crise e desespero que abate os militares que reclamam das péssimas condições de trabalho, déficit do efetivo policial e unidades e guarnições precárias”, declarou o coordenador-geral da Aspra, Marco Prisco Caldas Machado.
Mortes
Na madrugada de sábado, em Porto Seguro, morreu a tiros o soldado Antônio Elias Matos Silva, 31. Ele estava com a guarnição da qual fazia parte quando realizava uma abordagem a duas pessoas por volta das 2h no distrito de Pindorama. Os suspeitos resistiram à prisão e reagiram atirando contra os policiais.
Antônio foi atingido e encaminhado ao hospital Regional de Eunápolis, mas não resistiu aos ferimentos e morreu na unidade de saúde. Na ação, um homem e uma mulher, que estavam entre os suspeitos, também foram baleados e morreram. Antônio era lotado na Companhia Independente de Policiamento Tático (CIPT) Rondesp Sul. Natural de Itabuna, o policial fazia parte da corporação há 6 anos. Ele deixa esposa grávida e duas filhas.
No dia seguinte em Salvador, o tenente Mateus Grec de Carvalho Marinho foi morto a tiros em Cosme de Farias. Equipes da 58ª Companhia Independente de Polícia Militar (CIPM) e da Rondesp faziam ronda por volta das 20h na Rua Araçatuba, no Alto do Cruzeiro quando foram surpreendidos por um grupo com dezenas de homens armados. Mateus foi baleado na região do tórax.
Socorrido ao Hospital Geral do Estado (HGE), Mateus não resistiu e acabou morrendo. Na mesma ação, um suspeito foi baleado e também morreu. Com ele foi apreendida uma pistola calibre 45. “Nossas equipes foram atacadas por um grupo de cerca de 20 a 30 homens armados, com armas de fogo
Em seguida, dois suspeitos de envolvimento na morte do tenente foram presos. Um deles invadiu uma festa de aniversário e fez uma família do Alto do Cruzeiro, localidade do bairro.
Governador
O governador Rui Costa lamentou as mortes dos policiais deste final de semana. “Infelizmente ontem perdemos um tenente. Vai aqui minha solidariedade e sentimentos a seus familiares. Sábado perdemos um soldado em Porto Seguro. Vai minha indignação e revolta com esse modelo jurisdicional, criminal, existente no Brasil. Não quero jogar a culpa nos juízes. A lei criminal brasileira precisa mudar rapidamente. Não é possível, é inaceitável, que a mesma pessoa seja presa 1, 2, 5, 6 vezes, muitas vezes respondendo por homicídio. Eventualmente, aqueles que respondem são condenados com 1/6 da pena e possam ter algum tipo de liberdade. Considero como cidadão e pai de família inaceitável”, disse em entrevista à Rádio Metrópole na manhã desta segunda-feira.
Ele ainda associou a criminalidade crescente ao tráfico de drogas. “O Brasil virou um grande consumidor de droga no mundo, em várias camadas sociais. A gente precisa dizer com todas as letras: o consumo de drogas é que financia crime organizado, morte de adolescentes, morte de policiais”, afirmou. “Isso acrescido à atitude irresponsável do presidente da República, que liberou e facilitou compra e disseminação de armas. É visível o crescente número de armas, e o poderio de armas, dos bandidos”. Para Rui, os controles de quem compra o armamento não é suficiente. “Independente de quem compra, as armas, mais cedo ou mais tarde, acabam chegando na mão de bandidos. E o policial tem que ir pra rua pra enfrentar bandido com fuzil, com pistola automática, com metralhadora”.
Fonte: O Correio 24H
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