Uma nova onda de calor teve início na última quinta-feira, atingindo parte da Bahia e de outros 14 estados brasileiros. Seguindo o histórico do nosso estado, o fenômeno está mais concentrado na região Oeste, onde temperaturas acima dos 40ºC eram esperadas no final de semana. Embora recordes não venham sendo registrados localmente, outros pontos do país alcançaram novos marcos de calor este ano, a exemplo do Rio de Janeiro com seus 42,6ºC.
Além de afetar a qualidade de vida da população, o calor elevado tem impactos significativos no quadro de algumas doenças crônicas. Uma delas é a dermatite atópica (DA), uma patologia caracterizada por inflamação na pele, provocando lesões e coceira, e fragilizando a barreira cutânea. No paciente com DA, a pele fica tão sensível que o seu suor pode ser um agente irritante.
Professora do curso de medicina da Unifacs, a dermatologista Naíla Nunes ressalta a tendência do paciente com dermatite atópica ter uma pele mais ressecada, além de maior risco de sofrer desidratação, por conta da perda de água através da transpiração excessiva. “Ele acaba entrando num ciclo vicioso que interfere bastante na qualidade da sua pele, que é tão sensível”, alerta.
“Como é uma patologia considerada crônica, o paciente precisa entender que ele tem que se cuidar mesmo quando está bem, não só quando ele está com alguma dermatite em atividade, alguma lesão cutânea com mais coceira. O tratamento de manutenção também é super importante para melhorar essa função de barreira cutânea, então ele precisa fazer uso de hidratantes adequados”, esclarece.
A escolha dos produtos adequados pode ser detalhada pelo dermatologista que acompanha o paciente, mas uma regra é geral: não usar hidratantes perfumados. Segundo a médica, a função da hidratação, fundamental em qualquer temperatura, é auxiliar na recomposição da barreira cutânea, reduzindo o ressecamento, criando uma espécie de filme protetor na pele.
Uma maior ingestão de líquidos – água, sucos e chás – é outro cuidado destacado pela dermatologista para períodos mais quentes. Se a pessoa recorre muito ao chuveiro para minimizar o calor, a indicação é que ela se molhe, mas use sabonete apenas uma vez por dia, para não contribuir com a desidratação da pele. Pelo mesmo motivo, a água deve ser fria ou quase fria.
Esclerose
Enquanto parece elementar que o calor afete patologias com manifestações cutâneas, a exemplo de DA, lúpus e rosácea, o efeito soa inesperado na esclerose múltipla, uma doença neurológica e autoimune, caracterizada por danos progressivos à bainha de mielina que protege os nervos. O processo de desmielinização pode atingir o cérebro, na medula espinhal, qualquer ponto do sistema nervoso central.
No caso da esclerose múltipla, qualquer elevação de temperatura corporal pode impactar os sintomas, seja motivada pela prática de atividades físicas, por exposição ao calor do ambiente e até um banho muito quente, esclarece a neurologista Camila Orrico, da clínica Neuroliv. Danos na mielina reduzem a velocidade da condução do impulso nervoso, efeito que temperaturas elevadas também provocam mesmo em pessoas sem a doença.
Então o calor intensifica a dificuldade de condução do impulso nervoso característica da esclerose múltipla, potencializando sintomas temporariamente, com retorno à sua condição anterior quando a temperatura corporal é normalizada. Entre os sintomas mais comumente afetados, Camila cita fadiga, fraqueza, dormência e desempenho cognitivo. Embora seja menos frequente, sintomas novos também podem se manifestar nesses momentos.
“Os sintomas da esclerose múltipla dependem do local da lesão. Se a lesão for, por exemplo, no nervo óptico, esse sintoma é uma turvação visual, uma redução da qualidade visual”, ressalta a médica. Sua recomendação é que pessoas com a doença evitem situações favorecedoras do aumento de temperatura corporal, realizando exercícios físicos logo cedo ou no início da noite, bebendo sempre bastante água, especialmente gelada, além de dar preferência a banhos frios.
Impacto na saúde
A infectologista Nanci Silva, do Hospital Aliança Rede D’Or, lembra que o calor excessivo tem impacto na saúde geral. “Alguns estudos evidenciam que a associação entre altas temperaturas e elevadas concentrações de poluentes atmosféricos pode gerar um incremento nas taxas de hospitalizações, dos atendimentos de emergência e até aumento da mortalidade”, alerta.
Além de atuar na intensificação de sintomas, o calor favorece a ocorrência de algumas doenças, especialmente em decorrência da maior proliferação dos vetores envolvidos na transmissão. Dengue, zika e chikungunya, arboviroses presentes em várias regiões baianas, estão neste grupo, conta a infectologista Nanci Silva.
Dados divulgados pelo Ministério da Saúde na última quinta-feira mostram que nosso estado teve um aumento de 34,8% no número de casos de dengue, comparando os registros de janeiro a 25 de novembro deste ano com o mesmo período de 2022. A mortes causadas pela doença passaram de 29 para 32, considerando o período já citado, que corresponde à 48ª semana epidemiológica.
Zika e mais
Embora bem menos comum na Bahia, a zika teve um avanço ainda mais significativo, passando de 975 para 1564. O aumento de 60% foi observado no comparativo dos dois anos até a 34ª semana epidemiológica (correspondente à penúltima semana de agosto). Avaliada no mesmo período da dengue, a chikungunya teve redução de 37% no número de casos, tendo provocado uma morte em 2022 e duas este ano.
As estatísticas levaram o Ministério da Saúde a incluir sete municípios baianos entre os locais que receberão recursos adicionais para o combate às arboviroses. Salvador, Simões Filho, Feira de Santana, Jequié, Barreiras, Itabuna e Ilhéus terão repasse de R $3,4 milhões – valor total somando o montante destinado a cada cidade.
Fonte: A tarde
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