Hospitais lotados e cemitérios que não davam conta de atender a quantidade de mortos. Velórios coletivos com caixões fechados. Não faz muito tempo que a Bahia se chocava com as imagens da tragédia causada pela pandemia da covid-19. O estado registrou 189 mortes em um único dia, em abril de 2021. Há exatos três anos, a primeira pessoa era vacinada contra a covid na Bahia e, aos poucos, a imunização garantiu a melhora das condições sanitárias. Mesmo assim, seis milhões de baianos ainda não completaram o esquema vacinal.
Desde que a enfermeira Maria Angélica de Carvalho Sobrinho, na época com 53 anos, se vacinou sob os olhos da imagem de Santa Dulce dos Pobres, em Salvador, muita coisa mudou. Mais de 31 mil pessoas morreram por covid na Bahia nas quatro ondas da doença e outras cinco doses da vacina foram disponibilizadas. A última delas, reforço da bivalente, só está disponível para idosos e imunocomprometidos.
A primeira dose do imunizante bivalente – que garante a proteção contra variantes – foi disponibilizado em abril do ano passado. Desde então, 86% da população baiana não procurou os postos de saúde para se vacinar. Com menos mortes e casos graves, o medo diminuiu, o que preocupa especialistas.
“Observamos o aumento do número de casos desde o final do ano passado e, apesar de serem leves, trazem letalidade. A vacina deve entrar no calendário básico de vacinação e voltar a ter o grau de importância do início da pandemia”, analisa a médica Áurea Paste, coordenadora da residência de Infectologia do Instituto Couto Maia.
Somente entre 8 e 15 de janeiro, 20 pessoas morreram por complicações da covid na Bahia, segundo dados da Secretaria de Saúde do Estado da Bahia (Sesab). A engenheira agrônoma Aline Torres, 28, lembra bem dos momentos de aflição que viveu em 2020, primeiro ano da pandemia. A mãe dela precisou ser transferida de Barreiras, no oeste, para Salvador, para ser internada em uma unidade de terapia intensiva (UTI).
“Minha mãe é obesa, hipertensa e asmática. Só quem viveu o medo de perder alguém sabe a importância da vacinação. Em Barreiras não tinha leito e ela ficou uma semana internada na capital”, relembra. Durante a hospitalização, a mãe de Aline perdeu 17 quilos, mas não teve sequelas graves. Mesmo assim, toda a família completou o esquema vacinal.
Essa não é a realidade para a maior parte da população baiana. Luís Eduardo Magalhães, no oeste, onde a engenheira mora, por exemplo, tem uma das menores proporções de pessoas que tomaram todas as doses, de acordo com a Sesab. Por lá, 75% dos habitantes não chegaram a 3º dose. “É triste ver como a doença é banalizada por muitas pessoas aqui. Quem sai com máscara e álcool é visto como extraterrestre”, relata.
Fake news
Além da diminuição do medo, especialistas acreditam que as mentiras criadas sobre a doença afastaram as pessoas do posto de saúde. “Hoje é muito difícil convencer a população a se vacinar contra a covid. Só procuram quando têm alguma exigência, como viagem ou matrícula em algum lugar”, revela Núbia da Silva, coordenadora de imunização de Dário Meira, no centro-sul baiano.
No município de pouco mais de 10 mil habitantes, 83% da população não tomou a vacina bivalente. São pessoas como o corretor Cláudio Dantas que, aos 60 anos, já poderia ter se imunizado seis vezes contra a covid-19. “Aqui a pandemia já está passando, então muita gente deixou para lá mesmo”, diz.
Quem abandonou a vacinação antes das doses de reforço não têm garantia de proteção contra a covid, como alerta a médica infectologista Clarissa Cerqueira. “As doses precisam ser atualizadas ou não existem mais anticorpos para proteger contra a doença. Isso é um risco tanto para quem não se vacinou, quanto para quem está ao redor”, explica.
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